domingo, 25 de outubro de 2009





MODA E MODOS AO TELEFONE


( N. Talapaxi S.)




I
Toca o telefone.
- Não acredito! - Reclamo.
Estou na parte de baixo da casa, no meu atelier, há vinte degraus de escadas do quarto onde está o aparelho. E ele não pára de tocar.
- Porque que eu ainda não trouxe essa droga para baixo?
Tenho de deixar mesmo o trabalho pela metade para atender. E subo as escadas bufando.
- Alô!
- A gata está - pergunta uma voz menina.
A tal gata na verdade é H-Ta. A minha filha. E a voz ao telefone é de alguma amiguinha dela que eu (ainda) não conheço. E, com certeza, ela também não me conhece. Caso contrário, é provavél que ela não me faria essa pergunta. Assim...
Assim como quem cai de paraquedas na casa-da-mãe,joana; sem licença nem nada.
A minha filha trata sempre de passar para a kambada (colectivo de kamba) dela que detesto quando alguem liga e, sem “oi” nem “por gentileza”, vai logo perguntando.
- Escuta, querida, eu naõ sei quem é voce e já sou obrigado a te dar uma informação?
- Ah, desculpe, senhor! Sou amiga dela. Ela está?
- A senhora não respondeu a minha pergunta. Eu sou obrigado a falar se ela está?
Um instante de silencio se fez ."Deus passou", dizia minha mãe quando pairava uma nuvem silêncio no meio da algazarra em casa.
Eu o rompi a mudez com menos rispidez. Mais simpático.
- Alôooooo! Você táí, amor?
- Só to querendo saber se ela está. Só isso. - Essa última parte, “´só isso”, veio mais alterada, disposta a quebrar o meu cessar fogo. Mas mas mentive (digamos) educado.
- Eu sei. E acredito – segui deslilando mel.
- Mas um “por favor” não ficaria nada mau né!– falei com calma, simpatico; supondo que a moça estava perdendo a paciência comigo.
- Tudo bem. - respondeu secamente. E continuou.
- A H-Ta está, fazendo o favor?
- Não. Não está.
E ela desligou o telefone na minha cara. Sem “obrigado”nem “tchau”. Nem me deu tempo de dizer falar mais nada. Que a minha última resposta era só uma brincadeira. Que H-ta estava no portão com outra amiguinha.
Menina malcriada e mal agredecida! - pensei comigo. Deixei o meu trabalho pra lhe atender; recapitulei com ela uma lição de boas meneiras e ainda bate o telefone na minha chipala!?
Será que a minha filha, quando liga pra casa das kambas dela faz dessa meneira? Não. A minha filha, não. Está certo que ela tem defeitos mas ela não liga com essa falta de educação para casa dos outros. Ela até gosta de escutar e dançar aquela música do CD que ganhou
de uma amiga: ” por favor, obrigado, de nada… não tem de que; com linceça, como vai você……….”
Mas agora só falta a ”menina malcriada e malagradecida” do telefone ser a tal amiga que deu o CD de presente pra minha filha!


II
O telefone toca.
Lá vou eu. Vinte degraus de escada para atender. Mal coloco o aparelho no ouvido, antes que meus lábios se abrissem pra um “alo!”
- Quem tâ falando? - Pergunta alguém do outro lado.
- Eu nem falei nada ainda - respondi.
- Como é que você ta querendo saber quem ta falando?
- Mas agora você falou - retrucou a voz do ligador.
Esse rapaz é atrevido; pensei comigo. O que lhe falta na educação lhe sobra na coragem.
- Meu amigo, é voce quem ligou pra minha casa.
- 4588 3243 é o telefone da tua casa. E quem ta falando?
- Eu é quem pergunto quem ta falando. Porque você ligou pra minha casa…
- Custa responder? – o ligador, então, pegou pesado.
- Custa - respondi curto e grosso.


III
E o telefone toca outra vez.
Não perco mais tempo com indagações. Com discussões de malcriados. Não aceito.
Então, adotei um modo prático de atender.
E o telefone tocando.
Deixei tocar.
Por fim atendi.
- Bom Dia! Eu sou Wanguila-Mu-Nkutu’a-lau-Wasalamo-Wa-Mbongo. Quem está ao telefone e com quem deseja falar, por favor?
- O quê?
Repeti.
- Eu sou o Wanguila-Mu-Nkutu'a-lau... - o ligador nem me deixou continuar.
- Ta bom! Ta bom! Tá bom! Desculpe! Foi engano!
E desligou o telefone na minha cara.