terça-feira, 27 de outubro de 2009


PANTERAS NEGRAS

Priscila Preta



A propósito

de um anúncio de produto

para alisar cabelo, que dizia:

"você pode ser selvagem

mas seu cabelo não"



Meu sonho é que as mulheres

Alisem menos os cabelos

E analisem mais sua beleza



A evolução da resistência

Passa pela aceitação da imagem



Assim deixaremos de ser

Selvagens domesticadas

E passaremos a a ser

Panteras Negras

Prontas para dar o bote do argumento



Minha roupa não é uniforme

O trabalho acabou



E agora

Estou a passeio pelo conhecimento

domingo, 25 de outubro de 2009





MODA E MODOS AO TELEFONE


( N. Talapaxi S.)




I
Toca o telefone.
- Não acredito! - Reclamo.
Estou na parte de baixo da casa, no meu atelier, há vinte degraus de escadas do quarto onde está o aparelho. E ele não pára de tocar.
- Porque que eu ainda não trouxe essa droga para baixo?
Tenho de deixar mesmo o trabalho pela metade para atender. E subo as escadas bufando.
- Alô!
- A gata está - pergunta uma voz menina.
A tal gata na verdade é H-Ta. A minha filha. E a voz ao telefone é de alguma amiguinha dela que eu (ainda) não conheço. E, com certeza, ela também não me conhece. Caso contrário, é provavél que ela não me faria essa pergunta. Assim...
Assim como quem cai de paraquedas na casa-da-mãe,joana; sem licença nem nada.
A minha filha trata sempre de passar para a kambada (colectivo de kamba) dela que detesto quando alguem liga e, sem “oi” nem “por gentileza”, vai logo perguntando.
- Escuta, querida, eu naõ sei quem é voce e já sou obrigado a te dar uma informação?
- Ah, desculpe, senhor! Sou amiga dela. Ela está?
- A senhora não respondeu a minha pergunta. Eu sou obrigado a falar se ela está?
Um instante de silencio se fez ."Deus passou", dizia minha mãe quando pairava uma nuvem silêncio no meio da algazarra em casa.
Eu o rompi a mudez com menos rispidez. Mais simpático.
- Alôooooo! Você táí, amor?
- Só to querendo saber se ela está. Só isso. - Essa última parte, “´só isso”, veio mais alterada, disposta a quebrar o meu cessar fogo. Mas mas mentive (digamos) educado.
- Eu sei. E acredito – segui deslilando mel.
- Mas um “por favor” não ficaria nada mau né!– falei com calma, simpatico; supondo que a moça estava perdendo a paciência comigo.
- Tudo bem. - respondeu secamente. E continuou.
- A H-Ta está, fazendo o favor?
- Não. Não está.
E ela desligou o telefone na minha cara. Sem “obrigado”nem “tchau”. Nem me deu tempo de dizer falar mais nada. Que a minha última resposta era só uma brincadeira. Que H-ta estava no portão com outra amiguinha.
Menina malcriada e mal agredecida! - pensei comigo. Deixei o meu trabalho pra lhe atender; recapitulei com ela uma lição de boas meneiras e ainda bate o telefone na minha chipala!?
Será que a minha filha, quando liga pra casa das kambas dela faz dessa meneira? Não. A minha filha, não. Está certo que ela tem defeitos mas ela não liga com essa falta de educação para casa dos outros. Ela até gosta de escutar e dançar aquela música do CD que ganhou
de uma amiga: ” por favor, obrigado, de nada… não tem de que; com linceça, como vai você……….”
Mas agora só falta a ”menina malcriada e malagradecida” do telefone ser a tal amiga que deu o CD de presente pra minha filha!


II
O telefone toca.
Lá vou eu. Vinte degraus de escada para atender. Mal coloco o aparelho no ouvido, antes que meus lábios se abrissem pra um “alo!”
- Quem tâ falando? - Pergunta alguém do outro lado.
- Eu nem falei nada ainda - respondi.
- Como é que você ta querendo saber quem ta falando?
- Mas agora você falou - retrucou a voz do ligador.
Esse rapaz é atrevido; pensei comigo. O que lhe falta na educação lhe sobra na coragem.
- Meu amigo, é voce quem ligou pra minha casa.
- 4588 3243 é o telefone da tua casa. E quem ta falando?
- Eu é quem pergunto quem ta falando. Porque você ligou pra minha casa…
- Custa responder? – o ligador, então, pegou pesado.
- Custa - respondi curto e grosso.


III
E o telefone toca outra vez.
Não perco mais tempo com indagações. Com discussões de malcriados. Não aceito.
Então, adotei um modo prático de atender.
E o telefone tocando.
Deixei tocar.
Por fim atendi.
- Bom Dia! Eu sou Wanguila-Mu-Nkutu’a-lau-Wasalamo-Wa-Mbongo. Quem está ao telefone e com quem deseja falar, por favor?
- O quê?
Repeti.
- Eu sou o Wanguila-Mu-Nkutu'a-lau... - o ligador nem me deixou continuar.
- Ta bom! Ta bom! Tá bom! Desculpe! Foi engano!
E desligou o telefone na minha cara.






sábado, 24 de outubro de 2009


TUDO ISTO E MAIS


N. Talapaxi S.








Ao meu pai,


Meu Velho Querido,


Samuel Mambo domingos








Pela estrada da vida caminho;


Luzente ou plena de escuridão,


Asfaltada de flor ou de espinho


Não me abandona a tua mão





Vejo alegria no teu sorriso,


A segurança no teu abraço,


O amor se espelha no teu aviso


Ao me afastar de todo embaraço



O que tenho e o que não tenho


Devo a ti sem reclamar;


O mal aparto, o bem eu retenho


Como me ensinaste a amar





Páro e penso todas as vezes:


Quem mais me daria tanto bem assim;


Se o que fazes e o que não fazes


É tudo, tudo por amor de mim!






Tudo isso e mais


Me dá a convicção que jamais


Estive sem o teu carinho


Nesse caminho





Tudo isso e mais


Muito feliz me faz


Pois conto com o teu amor


Na alegria ou na dor



FRUTA PROIBIDA

N. Talapaxi S.






Quem te toca


Não te troca;


Quem não toca


Te provoca;


Quem te troca


Não se toca;


Quem provoca


Se choca;


Quem não se choca


Nem desboca;


Pois, quem tem boca


Te evoca!!!

quinta-feira, 22 de outubro de 2009


NÃO ME DIGA

PRA NÃO SONHAR
(N. Talapaxi S.)


“Vo i lukwikilu, i lusikidisu lua mana
Mesiwang’e vuvu, e nton’a lekwa
Ilembele moneka”
Ayibere 11:1
(Hebreus)



Não me digas pra não sonhar

Não é ao teu pé
Que o manto da kandengue se definha
E traz à tona o tenro esqueleto
Com a cara lívida
Implorando mais alma
Para escorar o corpo mazeza
Ao menos até o próximo amanhecer

Não me digas pra não sonhar

Não é a tua cabeça
Que perde os travesseiros
Nos pesadelos de cada torrente que cai
E racha o teto – já remendado,
Mistura-se ao pranto
Alaga a ilusão...
Só não arrasta a fé
Que – ainda – segura a cubata na encosta
Ao menos até a próxima chuva

Não me digas pra não chorar
Não é no teu prato
Que a colher raspa o vento
.....................................
Ao menos até a próxima esmola

Não me digas pra não sonhar

Não é o teu peito
Que sangra de tristeza
Quando a mão sai vazia do cafocolo
E nem um lwei furado
Pra inteirar na miséria da passagem
Em busca de bumbas subalternas
Pra contornar a indigência
Ao menos até o próximo biscate

Não me digas pra não sonhar

Não é o teu dorso
Que suporta os pregos dessa cruz
Dessa paixão que maltrata
Suga o viço
Enruga a cútis
Zomba – cospe – chuta – joga...
Mata um pouco a instante...

Pelo menos até o próximo biscate
Pelo menos até a próxima esmola
Pelo menos até a próxima chuva
Pelo menos até o próxima amanhecer

Só me resta agora o sonho.
Não me digas pra não sonhar!

segunda-feira, 19 de outubro de 2009


É A CARA DO PAI!

(N. Talapaxi S.)


Tremo de gratidão
Ao Sr Azor Ferreira

Que Deus lhe abençõe!


"Nkw'akundi ayingi,
Nkwa mpasi zayingi;
Vena yo nzodi anlaminima,
Mpangi uke".

Ngana 18:24
(Provérbios)



Cheguei cego e feito de retalhos,

Não me negaste a bengala nem o fato;

Longe do Zombo me abriste o desterro

E não te escusaste de repartir o prato



Cheguei mendigo e simplório marujo,

Me atendeste com o peixe e o cais;

Muitos mares ainda havia por navegar

Mas o destino é o viver quem faz



Cheguei,longe dos braços da Ilha do Cabo;

Me estendeste os teus - de bom anfitrião;

E sem nunca me teres visto mais negro

Me ofereceste o teu amor de irmão



Cheguei sedento - adejando sonhos,

E me deste de beber - não de utopias;

Deus não escreve por linhas tortas,

Nem te juntou a mim só por filantropia



Deus - que nos fez à Sua semelhança,

Um dia te fez - pra mim - como um anjo;

Só exalto as virtudes desse Onipotente

Que me dão o sopro ditoso que esbanjo



Que se veje em ti sempre a cara do Pai,

O verbo do Filho, o espírito do Santo...

Mesmo que a orbe vil te arme ciladas

E o galo, três vezes, venha a soltar um canto



Cheguei até aqui depois de cego, mendigo

E depois de tantos mares ter navegado

Pra render a Tata Nzambi toda a graça
E não deixar de te dizer: Muito Obrigado!

AMIGOS E AMIGOS
(N. Talapaxi S.)


"O nkundi ozolanga
Ntangwa zawonso,
O mpangi muna mpasi kawutukila"
Ngana 17:17
(Provérvios)


Assim como a sombra aparece
Quando há claridade
Mas, cobrindo-se o céu todo de nuvens,
Logo desaparece na escuridade


Desse modo há os amigos
Que só aparecem na prosperidade
Mas logo desaparecem
Quando chega a adversidade


Que amigos são esses
Que só aparecem quando há claridade?
Esses fazem a sombra
Mas jamais fazem uma amizade!


TEM DE AMIGO SÓ O NOME
QUEM NO PRAZER SE TRAZ
MAS NA DOR QUE NOS CONSOME
DE AMIGO NADA FAZ


Luanda, 1988